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Generalização apressada

- 5 min leitura

A generalização apressada é uma falácia que acontece quando tiramos uma conclusão sobre todo um grupo com base em um número muito pequeno de exemplos desse grupo. Isso pode levar a afirmações que parecem verdadeiras à primeira vista, mas que na realidade são enganosas.

Imagine que alguém diga o seguinte:

“Tenho certeza de que o candidato à presidência da república do PF, o Partido das Falácias, vai ganhar a maioria dos votos. Fiz uma pesquisa com as pessoas que conheço e praticamente todas disseram que votarão nele.”

O que está acontecendo aqui? A pessoa está tirando uma conclusão geral, “vai ganhar a maioria dos votos”, a partir de um grupo limitado de exemplos, “pessoas que conheço”. Mas será que essas poucas pessoas que ela entrevistou realmente representam a opinião de toda a população do país?

Provavelmente não. Afinal, o círculo de conhecidos de uma pessoa não é grande o suficiente para refletir a diversidade de opiniões de milhões de eleitores. Portanto, ao basear a conclusão em um grupo tão pequeno, essa pessoa cometeu uma generalização apressada.

Exemplo de generalização apressada em debates polêmicos

Conseguiu compreender como essa falácia funciona? No diálogo abaixo, a generalização apressada é usada em mais de uma ocasião. Tente identificar quando elas ocorrem.

Mateus –  Você sabe, aquelas feministas odeiam todos os homens.

Pedro – Sério?

Mateus – Sim, eu estava na minha aula de filosofia no outro dia em que Raquel fez uma apresentação.

Pedro –  O que Raquel disse?

Mateus –  Ela é a única da turma que faz parte desse grupo feminista, o Centro da Mulher. Ela disse que os homens são todos sexistas. Eu perguntei por que ela acreditava nisso e ela disse que seus últimos namorados eram sexistas….

Pedro – Isso não soa como um bom motivo para acreditar que todos nós somos sexistas.

Mateus –  Foi o que eu disse.

Pedro –  E o que ela respondeu?

Mateus –  Ela disse que tinha visto o suficiente de homens para saber que somos todos uns idiotas. Ela, obviamente, odeia todos os homens.

Pedro –  Então você acha que todas as feministas são como ela?

Mateus –  Tenho certeza que todas elas odeiam os homens.

Então, conseguiu identificar em quais falas ocorre uma generalização apressada?

Mateus usa um argumento falacioso ao afirmar que “as feministas odeiam os homens” com base no exemplo de sua colega Raquel. Ele não deveria ter dito isso com base em apenas um exemplo.

A Raquel, por sua vez, comete o mesmo erro ao dizer que “todos os homens são sexistas” com base apenas nos exemplos de seus últimos namorados. Novamente, são poucos exemplos para sustentar uma generalização dessa natureza.

Um exemplo de generalização apressada no projeto Escola sem Partido

Um terceiro exemplo dessa falácia pode ser visto em um debate atual. Há uma discussão no Brasil sobre doutrinação política nas escolas motivada principalmente pelo projeto de lei Escola sem Partido.

Analisando a discussão em torno da proposta do Escola Sem Partido, um dossiê produzido pela revista Nova Escola  aponta o seguinte

“O projeto [Escola sem Partido] se baseia em relatos esparsos e em uma pesquisa de 2008 encomendada pela revista Veja ao Instituto CNT/Sensus. A reportagem não detalha a metodologia do levantamento ou a margem de erro. Apenas diz que são 3 mil entrevistados. Na sondagem, estudantes mencionam citações predominantemente favoráveis em sala a figuras como Lênin, Che Guevara e Hugo Chávez.”

O texto conclui essa análise da seguinte forma

“Restam, ainda, os relatos pessoais de quem presenciou alguma doutrinação. Embora o Escola Sem Partido diga receber numerosas denúncias, o site do movimento registra somente 33. O Brasil possui mais de 45 milhões de estudantes. É preciso ter dados mais sólidos para separar casos isolados de tendências e, também, para ter uma visão mais clara sobre se, onde e em quais situações o problema acontece.”

A análise apresentada no texto mostra que dizer que a escola brasileira promove doutrinação política é uma conclusão fraca, já que os fatos que dão suporte a essa conclusão são poucos. Por isso, quem defende essa conclusão, com base nos dados disponíveis atualmente, está cometendo uma generalização apressada. É importante notar que a análise não defende a tese contrária, de que a escola brasileira não promove doutrinação. Defende apenas que não há dados suficientes para justificar a alegação de que isso ocorre.

Nem toda generalização é apressada

Falamos sobre como as generalizações apressadas podem nos levar a conclusões erradas. Mas será que toda generalização é um erro? Na verdade, em algumas situações, generalizar é não só aceitável, mas também necessário para tirar conclusões úteis.

Vamos pensar em pesquisas de intenção de voto, usadas para tentar saber qual candidato ganhará uma eleição. Considere que, durante uma campanha eleitoral, os institutos de pesquisa entrevistam milhares de pessoas em todo o país, fazendo perguntas como: “em quem você pretende votar?” No Brasil, normalmente as pessoas entrevistadas são em torno de 2 a 5 mil. E ainda assim , essas pesquisas geralmente conseguem prever o resultado das eleições com uma boa margem de acerto.

Mas por que esse tipo de generalização, supor que milhões de eleitores votam como alguns milhares, funciona? Por que a pesquisa se baseia em uma amostra que é grande e diversificada o suficiente para representar a opinião do eleitorado como um todo. Essa amostra inclui pessoas de diferentes idades, regiões, níveis de renda e outras características importantes. Quando a amostra é bem escolhida, podemos generalizar os resultados para o restante da população com uma certa confiança.

Veja a diferença do nosso primeiro exemplo: quando alguém pergunta só para seus amigos em quem vão votar e usa isso para prever o resultado da eleição, está cometendo uma generalização apressada, porque a amostra é muito pequena e provavelmente não representativa. Mas quando uma pesquisa é feita de forma cuidadosa, com um número grande e diversificado de pessoas, a generalização dos resultados é justificada.

Como evitar a falácia da generalização apressada

Para evitar cometer essa falácia, o primeiro passo é considerar se o número de exemplos que você está usando é realmente representativo do grupo maior que você quer descrever. Em outras palavras: será que a amostra que estou usando é grande e diversa o suficiente para tirar uma conclusão segura?

Relembre os exemplos que vimos no texto. No primeiro, a pessoa tirou a conclusão de que um partido iria ganhar a eleição porque todos os seus amigos disseram que votariam nele; no segundo, uma mulher concluiu que os homens não prestam com base no comportamento de seus namorados e um homem inferiu que as feministas odeiam os homens com base nas afirmações de uma colega; por fim, algumas pessoas acreditam haver doutrinação política nas escolas brasileiras com base em relatos pontuais e pesquisas limitadas. Em todos esses casos, conclusões são tiradas de forma apressada a partir de amostras pequenas e pouco diversas.

Assim, para evitar essa falácia, é essencial garantir que a amostra utilizada seja suficientemente ampla e diversificada.

Referências

Walton, Douglas. Lógica Informal: manual de argumentação crítica. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2012.

Ratier, Rodrigo. 14 perguntas e respostas sobre o Escola Sem Partido. Disponível em https://novaescola.org.br/conteudo/383/14-perguntas-e-respostas-sobre-o-escola-sem-partido